Por Yuna Yamazaki e Athir Timoteo
Seguindo a linha adotada pela nova gestão da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais – SECINT, a elaboração do texto da nova Portaria SECEX 44, de 24 de julho de 2020, que ampara o Regime Aduaneiro Especial de Drawback e entrará em vigor a partir do dia 17 de agosto de 2020, foi pensado com o intuito de trazer modernidade e objetividade. No entanto, se por um lado o emprego destas características trouxe, em alguns pontos, uma certa desburocratização e facilidade aos beneficiários do referido regime, por outro, resultou em algumas omissões e em aspectos mais complexos, o que frustrou a tão prometida oferta de segurança jurídica e simplicidade que esta nova norma traria.
Em sequência à nossa série de artigos que abordarão as principais alterações promovidas por essa nova legislação, discorreremos neste segundo artigo sobre as questões que envolvem um dos pontos em que o texto da nova portaria peca: as tratativas em relação às declarações de informações de valores de perdas, resíduos e subprodutos, as quais trouxeram mais dúvidas e complexidade do que as tratativas adotadas, até então, pela legislação que trata do Drawback (Capítulo III da Portaria SECEX 23, de 14 de Julho de 2011).
Para que possamos evidenciar tais afirmações, façamos um paralelo entre a legislação atual e a anterior no tocante ao assunto:
Vejamos abaixo os artigos 11, 41 e 59 da nova Portaria que fazem menção ao tema:
Artigo 11, Inciso II:
Art. 11. O ato concessório do regime de drawback suspensão deverá ser solicitado por meio de formulário eletrônico disponível em módulo específico do Siscomex, na página eletrônica "siscomex.gov.br", no qual o requerente deverá informar:
...
II - o valor previsto de subprodutos e resíduos que serão gerados no processamento das mercadorias importadas, e que não serão exportados, independentemente de sua destinação;
Artigo 41:
Art. 41. Ao solicitar o encerramento do ato concessório, a beneficiária deverá informar o valor comercial dos resíduos e subprodutos efetivamente gerados no processamento das mercadorias importadas e que não foram exportados, independentemente de sua destinação.
§ 1º O valor comercial dos resíduos e subprodutos que tenham sido efetivamente comercializados será o valor bruto da transação convertido em dólares dos Estados Unidos pela taxa de câmbio para venda Ptax do último dia útil anterior ao da emissão da respectiva nota fiscal.
§ 2º O valor comercial dos resíduos e subprodutos que não tenham sido comercializados terá seu valor de mercado apurado na data de solicitação do encerramento do ato concessório de drawback.
Artigo 59, Inciso I, alínea c:
Art. 59. O ato concessório do regime de drawback isenção deverá ser solicitado por meio de formulário eletrônico disponível em módulo específico do Siscomex, na página eletrônica "siscomex.gov.br", no qual o requerente deverá informar:
I - em relação às mercadorias empregadas ou consumidas na industrialização de produto exportado:
...
c) o valor de subprodutos e resíduos gerados no processamento das mercadorias importadas, e que não foram exportados, independentemente de sua destinação;
Agora, vejamos como a legislação anterior abordava o assunto em seus artigos 89 e 122:
Artigo 89:
Art. 89. Serão desprezados os subprodutos e os resíduos não exportados quando seu montante não exceder 5% (cinco por cento) do valor do produto importado (Decreto nº 6.759, de 2009, art.401).
§1º A empresa deverá preencher o campo “resíduos e subprodutos” do ato concessório com o valor, em dólares dos Estados Unidos (US$), dos resíduos e subprodutos não exportados.
§2º Ficam excluídas do cálculo acima as perdas de processo produtivo que não tenham valor comercial.
Artigo 122:
Art. 122. Serão desprezados os subprodutos e os resíduos não exportados, quando seu montante não exceder 5% (cinco por cento) do valor do produto importado.
§1º A empresa deverá informar no pedido de ato concessório o valor, em dólares dos Estados Unidos, dos resíduos e subprodutos não exportados. (Redação dada pela Portaria SECEX nº 47, de 2014)
§2º Ficam excluídas do cálculo acima as perdas de processo produtivo que não tenham valor comercial.
Em suma:
Da análise de ambos os textos, é possível observar que o atendimento à atual legislação é mais complexo, pois, enquanto a portaria anterior dispensava a necessidade da informação dos valores de perdas que não geravam receita, obrigando a declaração somente dos casos de resíduos e subprodutos com valor comercial, a nova portaria requer a disponibilidade desta informação de valores independentemente do cenário, não importando o conceito e interpretação do que sejam perdas, resíduos ou subprodutos, da destinação dada aos mesmos e, tão pouco, se estes geram ou não receita comercial.
Vejamos:
1) PERDAS:
Quaisquer elementos de descarte que seja derivado diretamente do processo produtivo. Em regra, não possuem valor comercial. Isto é, as perdas são inerentes ao próprio modus operandi do processo produtivo.
2) SUBPRODUTOS OU RESÍDUOS:
São quaisquer descartes do processo produtivo que resultem em elementos que gerem receita comercial. Por exemplo: sucata metálica.
Importante mencionar que a nova Portaria não faz mais nenhuma menção ao mínimo de 5%, ou seja, qualquer percentual de perdas, resíduos ou subprodutos, deverá ser informado.
Ademais, esses dados deverão constar no laudo técnico que poderá ser exigido no pleito do ato concessório e ser ajustado, conforme o realizado, no encerramento do ato concessório.
Outro ponto importante que ressaltamos é o da falta de clareza e objetividade que já ocorria na legislação anterior, o qual deixava subentendida a necessidade de recolhimento de tributos para as quantidades proporcionais das mercadorias que gerassem receita comercial excedente ao limite de 5% em relação ao seu valor de compra, impasse esse que não foi resolvido com a atual legislação, uma vez que o novo texto normativo não faz nenhuma menção quanto a esta prerrogativa. Desta forma, ao mesmo tempo que a essa supressão pode ser entendida como uma forma de simplificação e flexibilidade, por outro lado também pode ser vista como uma armadilha, pois induz à várias dúvidas, tais como:
A. Haverá ou não tributação para os valores de perdas, resíduos e subprodutos?
B. Caso haja tributação para os valores de perdas, resíduos e subprodutos, incidirá somente para os casos em que há geração de receita comercial ou para ambos os casos? (Muito embora não faça nenhum sentido tributar os casos que não gerem receita).
C. Se houver tributação incidente para os valores de perdas, resíduos e subprodutos que gerem receita de venda, a partir de qual montante será considerado, uma vez que não há mais a indicação do limite de 5%?
D. Nos cenários que compreendem os dois tipos de situações – (I) uma parte de perdas, resíduos e subprodutos que gera receita de venda e (II) outra parte que não gera receita - como ficará o lançamento dessas informações nos módulos do Drawback Web, uma vez que, atualmente, só existe um campo disponível para registro? Como será informado o valor que gerou receita e o que não gerou?
E. O sistema Drawback Web será alterado para criar um novo campo?
Logicamente que não faz sentindo algum tributar perdas que não tenham gerado receita. Inclusive, para algumas empresas, tais perdas geram custos, devido a especificidade dos tipos descartes, como, por exemplo, a destinação ambiental de itens químicos. Então, considerando a omissão legal da nova Portaria quanto à tributação, as empresas, além dos custos com a destinação, seriam ainda oneradas com o recolhimento de tributos. Realmente não faz sentido.
Essas questões nos chamaram muita atenção, pois implicam em mudança em procedimentos de controle e gestão. O que antes necessitava de procedimentos robustos, agora, muito mais. Portanto, empresas que não tinham o hábito de controlar esses valores e percentuais deverão rever os seus procedimentos para monitorar perdas, subprodutos e resíduos dentro do próprio processo de drawback, além, é claro, do laudo técnico e estrutura de produtos.
Inclusive, esperamos que esses pontos sejam esclarecidos e que a SUEXT reveja – e logo – as Dicas de Drawback [1] para adequá-las à nova Portaria.
[1] Dica de Drawback nº 1.4 http://www.mdic.gov.br/index.php/comercio-exterior/drawback/dicas-drawback
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