MP 1.040/2021: Modernização, facilitação e desburocratização do comércio exterior brasileiro

30 Mar 2021

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Foi publicada hoje, 30 de março de 2021, no Diário Oficial da União, a Medida Provisório nº 1.040, de 29 de março de 2021, que dispõe entre seus temas, sobre a facilitação do comércio exterior.

A publicação da MP 1.040 é vista como um grande passo de boa vontade por parte do governo federal para promoção da modernização, facilitação e avanço nas ações de desburocratização do comércio exterior brasileiro, entre outras áreas de negócios.

A MP reserva um capítulo especial (CAPÍTULO IV) nomeado de FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO EXTERIOR dividido em três seções que tratam de assuntos sensíveis e importantes para o desenvolvimento e celeridade das operações aduaneiras. Alguns desse assuntos, inclusive, foram protagonistas de embates normativos e interpretativos entre os operadores do comércio exterior, a exemplo do Siscoserv. Vejamos mais adiante.

Seção I - Das licenças, autorizações ou exigências administrativas para importações ou exportações

Seção II - Do comércio exterior de serviços, intangíveis e outras operações que produzam variações no patrimônio das pessoas físicas, das pessoas jurídicas ou dos entes despersonalizados

Seção III - Da origem não preferencial

Neste artigo faremos comentários sobre cada uma das alterações trazidas pela MP.

Art. 7º Fica vedado aos órgãos e às entidades da administração pública federal direta e indireta estabelecer limites aos valores de mercadorias ou de serviços correlatos praticados nas importações ou nas exportações ou deixar de autorizar ou de licenciar operações de importação ou de exportação em razão dos valores nelas praticados.

Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica aos regulamentos ou aos procedimentos de natureza tributária ou aduaneira de competência da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia.

Vedação expressa quanto ao estabelecimento de limites de valores de mercadorias e serviços correlatos e da impossibilidade de órgãos e entidades deixarem de autorizar ou licenciar operações de importação e exportação em razão dos valores nelas praticados.

Importante salientar que o disposto no Parágrafo Único é claro ao mencionar que essa vedação não se aplica aos regulamentos ou aos procedimentos de natureza tributária ou aduaneira de competência da Secretaria Especial da Receita Federal. Portanto, tampouco, aplica-se aos requisitos ligados à valoração aduaneira, direitos antidumping, isto é, em alterações que impliquem na modificação da base de cálculo dos tributos.

Art. 8º Será provida aos importadores, aos exportadores e aos demais intervenientes no comércio exterior solução de guichê único eletrônico por meio do qual possam encaminhar documentos, dados ou informações aos órgãos e às entidades da administração pública federal direta e indireta como condição para a importação ou exportação de bens a ponto único acessível por meio da internet.

1º O órgão ou a entidade responsável pela exigência administrativa, após a análise dos documentos, dos dados ou das informações recebidas por meio da solução referida no caput, notificará o demandante do resultado por meio do próprio guichê único eletrônico nos prazos previstos na legislação.

2º A solução de que trata o caput deverá:

I - permitir aos importadores, aos exportadores e aos demais intervenientes no comércio exterior conhecer as exigências administrativas impostas por órgãos e por entidades da administração pública federal direta e indireta para a concretização de operações de importação ou de exportação; e

II - atender ao disposto no Artigo 10, parágrafo 4, do Acordo sobre a Facilitação do Comércio anexo ao Protocolo de Emenda ao Acordo Constitutivo da Organização Mundial do Comércio, promulgado pelo Decreto nº 9.326, de 3 de abril de 2018.

A ideia trazida por esse artigo é interessante e algo que já era pretendido pelo Governo Federal e, em especial, pelo setor privado que sofre com a burocracia que ainda existe nas operações aduaneiras. Não é à toa que o processo aduaneiro é conhecido como um dos mais burocráticos do Brasil.

Com a disposição do artigo 8º, toda a operação aduaneira deverá ser centralizada por meio do Portal Único, desde a prestação de informações pré registro da declaração de importação -trâmites ligados ao licenciamento de importação e LPCO de exportação -, até informações e documentos necessários para a conclusão do desembaraço aduaneiro, o que nos leva a interpretação de que esse artigo está intimamente relacionado aos avanços e desenvolvimentos do Portal Único, entrada do Novo Processo de Importação - NPI e integração dos demais órgãos federais intervenientes nas operações aduaneiras, como por exemplo MAPA, ANVISA, DFPC, entre outros.

Quanto ao MAPA, além da anuência, o processo de verificação das embalagens de madeira, pelo disposto no artigo, deveria ser centralizado pelo Portal Único, o que tornaria o processo mais claro e célere aos importadores. Atualmente o processo é praticamente totalmente de modo físico.

Sabemos que esse é um procedimento visto como gargalo à liberação de mercadorias no Brasil, tanto pelo setor privado, quanto pelo próprio Governo Federal, o que ficou claro com a apresentação dos resultados do Time Release Study apresentado pela RFB em junho de 2020. É algo que está nas ações e que o Brasil precisa avançar rapidamente.

Além do mais, toda e qualquer exigência, solicitação, deferimento, indeferimento e outros resultados das análises deverão ser disponibilizadas pelo Portal Único.

O inciso II do artigo 8º faz menção expressa ao Acordo de Facilitação do Comércio o que deixa claro o interesse e os esforços do Brasil em avançar com a implementação das medidas do AFC, em especial, o Portal Único de Comércio Exterior.

Art. 8º

(...)

§ 3º O recolhimento das taxas impostas por órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta em razão do exercício do poder de polícia ou da prestação de serviço público relacionado a operações de comércio exterior ocorrerá preferencialmente por meio da solução de guichê único eletrônico a que se refere o caput.

Compete ao Ministério da Economia a gestão da solução de guichê único eletrônico a que se refere o caput.

Mais um importante passo para os avanços do Portal Único no que diz respeito ao Pagamento Centralizado de Comércio Exterior- PCCE. Hoje somente está disponível pelo PCCE o pagamento do ICMS e para determinados estados.

Com a inclusão do § 3º do artigo 8º, a intenção do Governo Federal é tornar centralizado, menos burocrático e dar mais celeridade ao pagamento de taxas que tenham relação com as operações aduaneiras. É bem provável que taxas de anuência de LI (Ibama, Inmetro, DFPC, ANVISA, CNEN, etc.) estejam disponíveis para pagamento pelo Portal Único, assim como o pagamento do AFRMM e TUM.

Art. 9º Fica vedado aos órgãos e às entidades da administração pública federal direta e indireta exigir o preenchimento de formulários em papel ou em formato eletrônico ou a apresentação de documentos, dados ou informações para a realização de importações ou exportações por outros meios, distintos da solução de guichê único eletrônico a que se refere o art. 8º.

1º O disposto no caput não se aplica:

I - quando, em razão de circunstâncias técnicas ou operacionais excepcionais relacionadas a determinada exportação ou importação, não for possível o uso da solução de guichê único a que se refere o art. 8º; e

II - aos procedimentos de habilitação, de registro ou de certificação de estabelecimentos, produtos ou processos produtivos relacionados com o comércio doméstico ou de modo análogo a este.

2º As exigências vigentes na data de publicação desta Medida Provisória serão revisadas na forma estabelecida em ato do Poder Executivo federal.

Importante dispositivo para a desburocratização do processo aduaneiro. Atualmente ainda existem diversos formulários (físicos e eletrônico) que exigem o preenchimento de informações redundantes, que ou foram já foram prestadas, ou que deverão ser prestadas futuramente. Em muitos casos é preciso preencher mais de um formulário com informações similares em órgãos diferentes.

Com a MP fica vedado o preenchimento de formulários sejam físicos ou eletrônicos por outros meios que não o Portal Único.

Avanço importante e muito esperado. Além do que, é mais um indicativo de que o MAPA deverá realizar todo o processo de verificação física das embalagens de madeira por meio do Portal Único.

Art. 10. Fica vedada aos órgãos e às entidades da administração pública federal direta e indireta a imposição de exigência de licença ou de autorização sobre importação ou exportação em razão de características das mercadorias, quando não estiverem previstas em ato normativo.

Parágrafo único. As exigências de que trata o caput vigentes na data de publicação desta Medida Provisória serão revisadas na forma estabelecida em ato do Poder Executivo federal.

Este artigo deixa claro que as exigências existentes que impactem no atendimento aos dispostos nos artigos anteriores serão revisadas na forma estabelecida em ato do Poder Executivo Federal. Isto é, certamente teremos novidades em breve relacionadas às alterações normativas.

“Art. 11. A Lei nº 12.546, de 14 de dezembro 2011, passa a vigorar com as seguintes alterações:

'Art. 25. Os órgãos e as entidades da administração pública federal direta e indireta, ressalvada a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia, compartilharão com a Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia dados e informações relativos às transações entre residentes ou domiciliados no País e residentes ou domiciliados no exterior que compreendam serviços, intangíveis e outras operações que produzam variações no patrimônio das pessoas físicas, das pessoas jurídicas ou dos entes despersonalizados.

§ 1º O compartilhamento de que trata o caput:
I - será realizado nos termos estabelecidos em ato do Poder Executivo federal;
II - observará os requisitos de sigilo e segurança da informação previstos em lei;
III - poderá abranger dados e informações obtidos:
a) no cumprimento de obrigações tributárias acessórias;
b) na realização de operações no mercado de câmbio; e
c) em pesquisas realizadas para produção, análise e disseminação de informações de natureza estatística; e
IV - observará o disposto na Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018.

§ 2º Ato conjunto do Ministro de Estado da Economia e do dirigente máximo do órgão ou da entidade da administração pública federal direta e indireta que detiver os dados e as informações estabelecerá as regras complementares para o compartilhamento de que trata o caput.' (NR)

'Art. 26. Os dados e as informações de que trata o art. 25 serão utilizados pela Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia para a elaboração e a compilação de dados estatísticos e para o exercício de outras competências institucionais definidas em ato do Poder Executivo federal.' (NR)

'Art. 27. Ato do Ministro de Estado da Economia estabelecerá normas complementares ao cumprimento do disposto nos art. 24 ao art. 26.' (NR)"

Outra disposição relevante da MP diz respeito ao já extinto SISCOSERV: a obrigação do contribuinte em prestar informações, para fins econômico-comerciais ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior relativas às transações entre residentes ou domiciliados no País e residentes ou domiciliados no exterior que compreendam serviços, intangíveis e outras operações que produzam variações no patrimônio das pessoas físicas, das pessoas jurídicas ou dos entes despersonalizados foi totalmente excluída do texto legal.

A nova redação dispõe sobre o compartilhamento das informações relativas a estas operações entre os órgãos e as entidades da administração pública federal direta e indireta. É interessante notar que esse compartilhamento de informações já havia sido discutido e apresentado pela nossa equipe quando na defesa da extinção do Siscoserv, uma vez que a redução de burocracias e controles excessivos são ações completamente alinhadas com o Acordo de Facilitação do Comércio da Organização Mundial do Comércio.

Ademais, estes dados e informações serão utilizados pela Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia para a elaboração e a compilação de dados estatísticos e para o exercício de outras competências institucionais definidas em ato do Poder Executivo federal.

Isso nos leva a crer que o Governo Federal não tem a intenção de substituir o Siscoserv por outro sistema, e sim utilizar informações que já estão disponíveis, observadas as disposições da Lei 13.709/2018 – Lei Geral de Proteção da Dados Pessoais - LGPD, expressamente mencionada na nova redação.

Quanto à seção III que altera a Lei 12.546/2011 e trata da origem não preferencial, a MP traz importantes alterações que devem ser atentamente observadas, uma vez que se trata de um tema complexo.

Como é sabido entre os profissionais que atuam com comércio exterior, um dos temas mais sensíveis – e difíceis -, está relacionado com a certificação de origem e suas ramificações: cálculo de conteúdo nacional e importado, declaração de origem, regras de origem, investigação de origem, entre outros. Uma vez emitida e assinada uma declaração de origem, o exportador – ou fornecedor – declara o conteúdo nacional para fins de enquadramento nas regras de origem e a certificação de origem, o que por sua reflete em benefícios fiscais para o importador.  Ou seja, é um importante instrumento de competitividade para a indústria brasileira e o objetivo é garantir que o produto vendido tenha conteúdo nacional suficiente para ser considerado originário.

Muitas inclusões, supressões e alterações foram trazidas com a MP 1.040.

No artigo 29 foram incluídas as alíneas “h”, “i” e “j” que tratam sobre questões inusitadas, que podem passar a ter uma recorrência maior daqui por diante, visto o desenvolvimento de novas tecnologias de exploração marítima e do espaço extraterreste, como aquelas obtidas por pessoas jurídicas de país do leito do mar ou do subsolo marinho, sempre que o país tenha direitos para explorar esse fundo do mar ou subsolo marinho e bens obtidos no espaço extraterrestre, sempre que sejam obtidos por pessoa jurídica ou por pessoa natural do país.

Já o § 2º que trata da transformação substancial foi dividido em dois incisos com a inclusão inédita do texto do inciso II, qual seja:

Art. 29

(...)

II - o produto em cuja elaboração tenham sido utilizados materiais não originários do país, quando o valor aduaneiro desses materiais não exceder cinquenta por cento do valor Free on Board – FOB do produto, ressalvado o disposto no § 3º.

3º Não será considerado originário do país exportador o produto resultante de operação ou processo efetuado no seu território pelo qual adquira a forma final em que será comercializado quando, na operação ou no processo, for utilizado material não originário do país e consista apenas em montagem, embalagem, fracionamento em lotes ou volumes, seleção, classificação, marcação, composição de sortimentos de mercadorias ou simples diluições em água ou outra substância que não altere as características do produto como originário ou outras operações ou processos equivalentes, ainda que esses resultem no cumprimento do disposto no § 2º ou em outros critérios estabelecidos pelo Poder Executivo federal na forma do disposto no art. 32.

O § 3º suprimiu a palavra “insumo” e substituiu “ainda que essas operações alterem a classificação do produto, considerada a 4 (quatro) dígitos” por “ainda que esses resultem no cumprimento do disposto no § 2º ou em outros critérios estabelecidos pelo Poder Executivo federal na forma do disposto no art. 32”.

O § 4º foi incluído na íntegra:

4º Caso não sejam atendidos os requisitos referidos no § 2º, o produto será considerado originário do país de origem dos materiais que representem a maior participação no valor FOB." (NR)

O art. 34 também foi modificado consideravelmente. Foram incluídos termos como fornecedor estrangeiro e importador, além, é claro, de manter o exportador, dando a entender que ambos são responsáveis pelas informações prestadas no processo de certificação de origem.

Art. 34

(...)

3º Na hipótese de o produtor estrangeiro, o exportador ou o importador negar acesso às informações referidas neste artigo, não as fornecer tempestivamente ou criar obstáculos ao procedimento de verificação de origem não preferencial, a mercadoria será presumida como originária do país gravado com a medida de defesa comercial que motivou a abertura de investigação de origem não preferencial." (NR)

A inclusão do § 3º trata da presunção de mercadoria originária do país como medida de defesa comercial que motivou a abertura de investigação de origem em caso de hipótese da negativa da prestação de informações, informações prestadas intempestivamente ou criação de obstáculos da verificação de origem não preferencial.

Uma das alterações mais importantes aconteceu no artigo 36 que trata da competência de verificação de origem, da provocação por denúncia ou ato de ofício quando houver indícios da falta de observância dos artigos 31, 32 e 34, além da notificação do produtor estrangeiro para que preste informações.

Além do mais, suprimiu o termo “na fase de licenciamento de importação”, deixando aberto o momento da instauração do processo de investigação de origem.

O § 2º diz respeito à conclusão do processo de investigação de origem, em que tal a conclusão será – termo que remete a obrigação legal e não discricionária da autoridade aduaneira – aplicada a todas as mercadorias idênticas, levando a interpretação de que contempla, inclusive, o período de decadência quinquenal.

Outro ponto interessante, foi a menção aos princípios do contraditório e da ampla defesa no caso de o interessado não concordar com o resultado e solicitar a revisão da origem para que, então, possa demonstrar o atendimento às regras de origem não preferenciais.

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[1] Decreto nº 9.326, de 3 de abril de 2018 – Acordo de Facilitação do Comércio:

4.0 Guichê Único

4.1. Os Membros envidarão esforços para estabelecer ou manter um guichê único que permita aos comerciantes apresentar documentos e/ou informações exigidas para a importação, a exportação ou o trânsito de bens por meio de um único ponto de entrada para as autoridades ou órgãos participantes. Após o exame dos documentos e informações por parte das autoridades ou órgãos participantes, os resultados serão comunicados tempestivamente aos requerentes por meio do guichê único.

4.2. Nos casos em que a documentação e/ou informações exigidas já houverem sido recebida pelo guichê único, essa mesma documentação ou informações não serão solicitadas por autoridades ou órgãos participantes, exceto em circunstâncias urgentes e outras exceções limitadas que sejam tornadas públicas.

4.3. Os Membros notificarão ao Comitê os detalhes de funcionamento do guichê único.

4.4. Os Membros utilizarão, na medida do possível e razoável, tecnologia da informação para apoiar o funcionamento do guichê único.

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Artigo por Yuna Yamazaki e Victória Mello.

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